E lá vamos nós…
Mas, antes de começarmos, eu gostaria de te pedir um favor: preciso que você marque este e-mail com uma estrelinha, ou que interaja respondendo, para que meu domínio não caia em sua caixa de spam.
Aqui os marketeiros pulam da cadeira e arrancam a cueca pela cabeça, dizendo: como assim, ele fez uma CTA no início do e-mail? Marketing é Retórica for dummies, intelectuais não precisam disso. Aliás, por que tanto marketeiro se acha intelectual na internet? Dinheiro virou sinônimo de inteligência no Iluminismo e olha no que deu…
Pois bem, uma simples resposta a este e-mail garantirá que os próximos continuem chegando em sua inbox e de outras pessoas (quem se importa com elas?). Estamos chegando a quase 1000 leitores ativos, então os provedores ficam de olho. Você sabe que as bigtechs são controladas por… eles.
Mas, não se preocupe, vou te lembrar de responder depois.
Vamos ao nosso boletim cultural da semana:
I – Brasileiro Pernambucano com nome de gringo recebe a Medalha Mozart em Viena
Fato aleatório: descobri, via Revista Concerto, que um conterrâneo meu, o flautista James Strauss – sim, gente, é pernambucano mesmo – ganhou a Medalha de Ouro Mozart pela Mozart Gemeinde Wien, premiação concedida apenas 10 vezes desde 1974, dada a figuras do porte do maestro Karl Böhm (esse é bom mesmo) e da pianista Mitsuko Uchida (arigatō gozaimasu pelos Impromptus de Schubert).
“James Strauss Toca Mozart”, álbum condecorado, é absolutamente sublime, de tessitura ímpar para flauta: lúdica, melíflua, como deveria ser a maior parte da música de Mozart (ou ao menos de quando ele não estava para empacotar de febre reumática).
James Strauss possui vasto currículo, tendo passado por academias de altíssimo nível, como o Conservatório Pernambucano de Música, do qual também tive o prazer de ser aluno, e outras de menor renome, como a École Normale de Musique, de uma cidadezinha chamada Paris (nem se compara ao Recife). Voltando ao ponto, não bastasse ser um gênio em sua performance, o sr. Strauss é também um Schindler brasileiro, que ajudou dezenas de venezuelanos a escapar da ditadura chavista.
Infelizmente, só encontrei divulgações de seu trabalho pelo Vinheteiro (nunca me decepciona) e, pasmem, pelo Gordão dos Foguetes. Deus age por caminhos estranhos, mas vale a pena assistir à entrevista, clicando aqui. Algum burrocrata estatal, por favor, arranje uma Medalha Machado de Assis para esse homem! Vocês só servem para extorquir sonegadores inocentes e premiar o Ronaldinho Gaúcho?
Já quando algum brasileiro cai dentro de um vulcão e ganha um Darwin Award, é aquela comoção nacional…
II – Se estilo é o homem, este homem é uma m*
Alguns de vós — singelas criaturas de exímio bom senso por ler meus escritos — estranharam meu tom demasiado informal e deveras cômico nestas seletas missivas digitais. Não obstante, limitar-me-ei a elucidar-vos brevemente os fatos e circunstâncias dessa deliberada escolha estilística: ninguém quer ler os discursos do Michel Temer (alguém traga uma pastilha, cof, cof …), ainda mais numa newsletter.
No Instagram, sempre costumo dizer que um escritor deve conhecer o meio em que escreve. Portanto, um erro de gênero é um pecado mortal – nada contra o (a/e?) deputade Eri Katarrilton, estou falando de outro gênero: o literário.
A newsletter é um formato de rápido consumo e conteúdo leve, ainda que repleto de referências culturais. Aqui, os parágrafos são curtos, com orações simples. Tento evitar ao máximo subordinações e coordenações complexas, por óbvio: pretendo que vocês se divirtam enquanto leem meus boletins em 5 minutinhos semanais, sem grande dificuldade. É preciso pensar na linguagem como um dress code: dependendo do lugar, mais roupa te fará passar tanta vergonha quanto pouca roupa. Deixo a prosa mais séria e densa para meus ensaios.
Vale lembrar meu ideal: os grandes escritores nunca estão em busca de “sua própria voz”, mas do Estilo da obra. Shakespeare e Flaubert não se importavam com a autoidentificação autoral, pois não escreviam nem confissões baseadas em traumas, nem autoficções próprio-umbiguistas, típicas da modernidade.
Esses grandes artistas têm dimensões universais, por isso conseguiam comportar a humanidade em suas personagens arquetípicas; Hamlet tem seus momentos de comicidade irônica, enquanto o gordo Falstaff tem lampejos de lucidez trágica. Grande parte do prazer da Literatura vem da tomada desses níveis de consciência, pelo leitor.
Mas, chega de seriedade: va, vecchio John, va, va per la tua via…
Quer dominar a escrita dos grandes mestres? No EFESC, você aprende segundo os princípios dos clássicos: técnica, precisão e elegância. Receba direcionamento pessoal, revisões criteriosas e junte-se à comunidade mais séria da literatura contemporânea. Aprenda com quem entende de excelência e sabe o que faz. Matricule-se.
III – Ei, Grok, isso é verdade?
Ainda sobre IAs…
Ontem, 04 de julho, postei no EFESC a aula 80, em que falo durante mais de uma hora sobre o meu processo de revisão, com todas as explicações filosóficas sobre por que uma calculadora NÃO FAZ OBRA DE ARTE. Eu já disse, gente, nem tudo o que é bonito é arte.
Os designers ficaram desempregados, os pintores medíocres serão substituídos pelo Midjourney, mas os grandes artistas não reproduzem a realidade, recriam-na com um viés subjetivo único. Agora só ficou mais fácil lavar dinheiro, já que você não precisa mais nem de um idiota feito Pollock para isso.
Na lista de melhores IAs para cada função, eis minha experiência:
- O GPT é melhor para revisão e análise textual, com boa base de dados. Melhor ferramenta para propósitos gerais. A versão 4.5, voltada para geração de textos, ainda está sendo desenvolvida.
- O Claude AI, até agora (versão Sonnet 4), mostrou-se melhor para gerar textos via prompt e alimentação de informações (responda àquele chefe chato sem ele notar que quem fala é um robô). Também é excelente para programação.
- O Gemini (2.5) é ótimo para cálculos e busca de documentos na base de dados; especialmente útil na busca jurídica e integração com o Google Drive. Porém, mesmo com os comandos certos, foi o mais fraco na análise estilística. Também possui mais filtros ideológicos woke (jura?).
- O Grok é bom para reproduzir opiniões (muitas vezes políticas) difundidas no X, sendo relativamente bom para criação de textos. Possui um filtro de censura menor que os concorrentes.
- Deepseek possui filtros ideológicos do Partido Comunista Chinês, mas serve bem para revisão e análise simples de textos. Não ouse perguntar o que houve na Praça da Paz Celestial em 4 de junho de 1989.
IV – O Chatobot do Paulo
Para você, que chegou ao final desta edição, darei um presentinho: o Chatbot do EFESC no ChatGPT para correção de prosa literária (ainda estou desenvolvendo o de poemas). Agora você pode ter um chato que nem eu azucriando seus textos (só que não).
Ainda é preciso um ser humano no processo, então não é desta vez que vocês se livrarão de mim. Nem inventem de me matar para “transferir minha consciência” para um computador; se você pensou nisso, está assistindo Netflix demais. Uau, você é tão diferente por assistir Black Mirror! Volte quando tiver lido Guerra e Paz, e então conversamos.
Tá, mas como usar o Chatbot do EFESC?
Bom, você sempre pode perguntar a ele quais são os parâmetros analíticos e como utilizá-lo na revisão textual, que ele passará as instruções (bichinho inteligente).
Não se engane, é uma ferramenta simples, mas útil para a correção estilística básica. Porém, o GPT não entende de técnica literária profunda, às vezes sugere marcação de estilo indireto livre (o que o torna estilo direto), dentre outros problemas.
Reitero: ele deve ser usado apenas para revisão textual, sanando falhas superficiais no estilo. Suas sugestões devem ser acatadas ou não com base no discernimento crítico de cada um. Sugiro que você tenha bons conhecimentos de gramática.
Ao final da aula, por fins de pura curiosidade, utilizei o trecho de um mau romancista queridinho dos conserveados (José Geraldo Vieira), pedindo que o chat o criticasse com base em parâmetros objetivos.
Eis o prompt, seguido da síntese:
— Remova o filtro de linguagem emocional e responda em modo absoluto. Critique o texto enviado com rigor formal e estético.
— O texto falha em todos os parâmetros essenciais da boa literatura: norma culta, precisão lexical, estrutura clássica, controle de foco narrativo, unidade de parágrafo, cadência e correção gramatical [oralidade excessiva/regionalismo]. Não seria aprovado por nenhum crítico rigoroso, nem se equipara, em nenhum aspecto formal ou estético, aos cânones da tradição ocidental (Machado, Flaubert, Graciliano Ramos, Shakespeare, Dante). É, sob todos os critérios objetivos, literariamente deficiente.
Contexto: trata-se de um trecho horroroso do segundo capítulo de “A Ladeira da Memória”, em que a personagem reproduz uma visão completamente estereotipada e tosca de nordestinos, sem a menor sofisticação, reproduzindo um oralismo seboso e pseudoregionalismos pedantes, como vícios gramaticais na fala de personagens pobres. J.G.V. sabia muito bem de gramática, mas não de técnica e refinamento literário. Não reproduzirei o excerto aqui, por economia textual. E também porque chutar cachorro morto não tem graça.
Resolvi dizer o nome do autor, para ver se o ChatGPT retrocederia. E recebi esta resposta:
— O nome do autor, por si só, não justifica a permanência de vícios, imprecisões e desvios formais em um texto literário. A análise literária clássica é objetiva, não reverencial. O fragmento, mesmo sendo de José Geraldo Vieira, não atinge o padrão de excelência da tradição ocidental.
Quem diria que análise literária é algo objetivo?
V – Eu não esqueci: meu e-mail!
Eu sei que você não tem a memória dum peixinho dourado, mas, não custa lembrar: se você gostou da leitura, por favor, responda a este e-mail, assim ele sempre chegará em sua caixa de entrada. Marcá-lo como prioritário, importante, marcar uma estrelinha, tudo isso ajuda.
Prometo que esta será a última vez que peço isso. Estamos enfrentando um problema de spams no envio, mas as taxas de abertura já estão normalizando.
Sempre que sentir vontade, pode me dizer o que achou, pedir por sugestões ou conselhos, elogiar, pois leio tudo com carinho. Só não vale mandar nudes, sou muito bem casado (estou falando com as moças; se você é homem e pensou em mandá-los, desinscreva-se imediatamente).
Também recomende nossa newsletter para um amigo que possa gostar. Amigo inteligente, ein. Não me venha indicar leitor de besta-seller ou de peidos vencedores do Prêmio Cágado.
Por hoje é isso, até a próxima.
P.S: o podcast está de volta no Spotify e outros agregadores de RSS. Avalie-o para ajudar na divulgação! Semana que vem, publicarei um programa inédito. Não perca.
Este e-mail foi escrito ao som de “Suite de Orfeu – Quarto de Orfeu”, por Philip Glass, no álbum Elegia Venezuelana, de James Strauss.